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O direito de morrer

Lúcio Flávio Pinto - 15/10/2018

Neste dia 9 de setembro transcorreu o centenário do nascimento de Cesare Pavese. Sob silêncio quase absoluto. Parece que foi esquecido. Seu último livro traduzido para o português que li foi O Ofício de Viver, de 1988, o que mais me impressionou. Tinta anos depois, jamais foi reeditado. Nem pela Bertrand, responsável pela edição única. Ela vale de 100 a 200 reais na Estante Virtual, preço caro, mas justo. No entanto, parece não haver interessados nas edições, todas usadas. É um livro precioso. Pavese acabara de escrever a última página do seu diário, em 1950, num hotel, quando se suicidou, às vésperas dos 42 anos.

Numa anotação manuscrita, encontrada entre seus pertences muitos anos depois da sua morte, Pavese escreveu: “Andei à minha procura”. Caminhada de toda vida, resultando em frustração, apesar de todo sucesso como escritor, poeta e tradutor (incluindo as prosas dificílimas de Joyce, Faulkner e John  dos Passos). Em Diálogos com Leucó, de 1947 (publicado pela extinta Cosac & Naiff), ele observou: “Em suma, todo o problema da vida é este: como romper a própria solidão, como comunicar-se com os outros”. Bem que tentou. Entregou os pontos quando pressentiu que não havia mais o que fazer, ou fazer que já não tivesse feito.

“Todos os pecados têm origem num sentido de inferioridade, também chamado ambição”. E sua consequência: “A dificuldade de praticar o suicídio está nisto: é um ato de ambição que só pode ser realizado depois de superada toda a espécie de ambição”.

Diz-se que Pavese se matou em seguida a ter escrito algo no papel no diário, que manteve de 1935 (quando foi preso pelos fascistas) a 1950. Com a serenidade de quem sempre considerou essa hipótese, tendo chegado a ela depois de uma vida dedicada a superá-la, desviando-se de um final que sempre estivera nas suas cogitações, como a dar a sua aprovação à conhecida frase de Albert Camus: “Existe apenas um único problema filosófico realmente sério: o suicídio. Julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida significa responder à questão fundamental da filosofia”.

O grande Cesare Pavese merece ser lembrado, apreciado e admirado.




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