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O médico e o monstro
Jogadores de futebol truculentos e incompetentes às vezes recorrem a golpes sujos para suprir sua incapacidade de marcar e desarmar os atacantes habilidosos que enfrentam: provocam - ou agridem - os adversários até que eles reajam e ambos sejam expulsos.
Jair Bolsonaro é jogador desse tipo. Cada vez que seus erros e patologias são descobertos, revelados e denunciados, ele dá botinadas e aperta mais ainda o torniquete da provocação. Sua psicopatia, sem limites, o leva a agir além do bom senso, da previsibilidade e mesmo da tolerância. Não importa: o que ele almeja é a crise, o confronto, o caos.
Fica mais perigoso na evolução dessa escalada. Pode parecer que está derrotado, mas até agora seu comportamento delirante e alucinado não foi contido. Esperto, sagaz e inconsequente, a persistência da sua força se sustenta na nau dos insensatos, na parcela de malucos, radicais, intolerantes ou ignorantes. Somados, eles constituem seu reduto político, ideológico e eleitoral. Um universo suficiente para se sensibilizar pelas declarações do "mito" e criar um ambiente de truculência que agride as instituições. Quanto menos provável se torna a possibilidade da sua reeleição (ou da sua elegibilidade até 2022), mais risco e ameaça Bolsonari representa para o Brasil.
Ele acaba de dar mais um exemplo dessa demência calculada ao propor a eliminação da obrigatoriedade do uso de máscara de proteção contra o coronavírus. Sem qualquer fundamento científico nem a mais remota sensatez, tirando suas crenças de teorias mágicas e conspirações maquiavélicas (como a origem geopolítica da pandemia, tese reforçada pelo questionamento, apoiado por Biden, para a reabertura da investigação sobre o acidente em Wuhan), Bolsonaro acha que a vacinação, mesmo em primeira dose, ou a não incidência de contaminação, dispensam a máscara.
Para dar aparência de plausibilidade a esse absurdo, ele pediu ao ministro da Saúde um estudo a respeito. Embora médico, Queiroga aceitou executar a tarefa, quando deveria colocar seu cargo à disposição do chefe se ele não retirasse a incumbência. Depois de desmoralizar um general da ativa do Exército, que nada entendia do cargo que assumiu, Bolsonaro irá desmoralizar um médico, que, ao contrário de Mandetta e Teich, imita Pazuello. Aberta foi a porta para mais uma substituição, exatamente quando se forma a terceira onda da pandemia.
Bolsonari já provou não ser capaz de comandar o país. Não se pode afastá-lo do cargo ignorando que o Brasil é uma democracia e ela precisa ser respeitada integralmente. Uma solução legal (e convencional) é o impeachment. Esse caminho só pode ser trilhado pela via parlamentar, que legitima o processo político de afastamento do presidente da república. É uma trilha complicada e mais demorada. A maioria dos guias dessa opção é destituída de credibilidade, do que são exemplo o presidente e o relator da CPI da covid.
É preciso examinar duas alternativas, ambas excludentes de golpes.
Uma, seria o afastamento de Bolsonaro do exercício da presidência, por decisão do Supremo Tribunal Federal, acionado pelo meio processual competente para, promovendo uma perícia judicial, atestar a incapacidade psicológica do ex-capitão.
A segunda via seria por uma intervenção do STF, a pedido, no Ministério da Saúde. Mesmo se mantendo na presidência, Bolsonaro perderia toda jurisdição sobre a saúde pública brasileira. O Supremo nomearia um interventor, por tempo certo (prorrogável) , que poderia ser o médico Nelson Teich, aquele que mais se aproximou de uma atitude positiva em relação à covid-19 (e por isso mesmo abandonou a função antes de completar o primeiro mês como ministro).
Do contrário, o Brasil cada vez mais se parecerá a Bolsonaro. Ou seja: um monstro.