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Flamiglia Bolsonaro

Lúcio Flávio Pinto - 05/10/2020

O presidente Jair Bolsonaro sacramentou a escolha do juiz federal Kássio Nunes para ministro do Supremo Tribunal Federal, no lugar do decano da corte, Celso de Mello, mesmo sabendo que o seu ungido ascendeu ao Tribunal Regional Federal da 1ª região com o patrocínio da então presidente Dilma Rousseff.

 

Foi alegando esse motivo que o pastor Silas Malafaia, que era um dos mais ardorosos partidários de Bolsonaro, desancou o “mito”. Acusou-o de cometer um “absurdo vergonhoso” e de ceder “a quem jamais deveria ceder”, o centrão de um lado, a esquerda e o PT do outro lado.

 

Bolsonaro respondeu no mesmo diapasão, sem citar o destinatário dos seus disparos verbais: "Eu lamento muito que uma autoridade lá do Rio de Janeiro, que eu prezava muito, está me criticando muito, com videozinho me xingando de tudo o que é coisa".

 

Para o presidente, a atitude é de “infâmia” e de “covardia”. Disse qual seria o motivo real: “ele está fazendo isso porque queria que eu colocasse um indicado por ele".

 

Bolsonaro não hesitou em enfrentar a ira de Malafaia. Seu maior objetivo no momento não é a pandemia do coronavírus ou a renda mínima para os pobres brasileiros. É livrar a sua família das barras dos tribunais. Todos são réus, denunciados ou indiciados em procedimentos investigatórios ou ações judiciais, inclusive ele próprio. Por causa do seu foro especial, todos os procedimentos acabarão sendo decididos diretamente pelo STF, como última instância.

 

Bolsonaro está quebrando regras e abrindo exceções para ter maioria na corte. Se for necessário, designará outro integrante do TRF-1 para a vaga que se abrirá em julho do próximo ano, com a aposentadoria compulsória do ministro Marco Aurélio de Mello, ao atingir também os 75 anos. O motivo da inovação: o Rio de Janeiro é o local dos crimes e irregularidades da família Bolsonaro, sob apuração federal e estadual.

 

As várias frentes abertas conduzem a um compartimento que era – e ainda é – pouco conhecido na biografia de Jair Bolsonaro. O povo o elegeu presidente da república, quase dois anos atrás, porque ele adquirira a imagem de anti-PT, anticorrupção, anticultura politicamente correta e tudo mais da visão de mundo que a classe média esparrama por todo tecido social, com sua capacidade de difundir a sua hegemonia ideológica. Essas marcas provinham exclusivamente das atitudes extremadas do ex-capitão em sua longa carreira parlamentar de gritos, empurrões e ameaças em geral.

 

Agora vai se revelando o mundo da família Bolsonaro, vizinho da violência do Rio, das suas milícias, da sua polícia violenta, do tráfico de drogas, da economia subterrânea que funciona com dinheiro vivo, dos seus advogados (como Frederick Wasseff, representante jurídico da família até recentemente), que transitam entre a claridade oficial e a obscuridade do submundo, com regras próprias e desembaraço sem igual.

 

Com sua ousadia e desapreço pelas limitações das regras éticas, morais e mesmo legais, Bolsonaro quer tapar esse subterrâneo apenas divisado e prosseguir na sua carreira de “mito”, um título vazio, mas que funciona num país de formação precária e superficial como o Brasil de hoje, mal comparando – mas comparando – a Alemanha de depois da primeira guerra mundial. O Brasil de 2018 tinha bastante a ver com a Alemanha de 1924.




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