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Raul Seixas dedo-duro?

Lúcio Flávio Pinto - 25/10/2019

O jornalista Jotabê Medeiros lançou uma isca para atrair o público para o livro que lançará no dia 1º. Em Raul Seixas: não diga que a canção está perdida, ele afirma que o seu biografado funcionou como dedo-duro. Em 1974, ao ser preso pelo Dops, a polícia política, no Rio de Janeiro, ele teria entregado o seu parceiro, o hoje consagrado escritor Paulo Coelho.

 

A história não é inverossímil por manchar a reputação de Raul Seixas. Simplesmente não tem credibilidade por falta de provas claras da traição. Jotabê se baseia num documento que encontrou no Arquivo Público do Rio, que teve origem no terrível Doi-Codi, o braço policial mais atuante da ditadura militar. Uma leitura atenta do documento pode suscitar dúvidas que, transformadas prematuramente em certezas, podem levar à interpretação do autor da biografia do rei do rock nacional nos anos de chumbo.

 

Raul foi chamado a depor no DOPS (e não no Doi-Codi), fez um breve depoimento, saiu, voltou com Paulo Coelho, saíram juntos, Pulo voltou a ser preso com a namorada e teria sido torturado e mantido preso por mais alguns dias. Foi solto e nunca mais teve complicações com o regime. Em erro primário do órgão da repressão política, ele foi vinculado ao PCBR e sua namorada a outro partido comunista, o PC do B, dos quais nunca fizeram parte.

 

O motivo da prisão, na verdade, foi um livreto que acompanhou o disco Krig-ha-Bandolo e as ligações dos dois com uma sociedade secreta e as drogas. Mais razão moral do que política. Mais repressão a práticas proibidas pelos costumes do que a atuação política.

 

Medeiros atribui essa novidade a uma leitura atenta que fez do documento, lido por outros interessados na dupla mais pelo lado da censura às suas músicas do que  a uma até então desconhecida militância política. O jornalista Fernando Morais, que conviveu ao longo de quatro anos com Paulo Coelho para escrever sua volumosa biografia, desconhecia o assunto. O próprio biografado não se refere a ela. Atribui o distanciamento que se seguiu entre ele e Raul a um sentimento de abandono que teve por não ter recebido a solidariedade do parceiro. Mas voltaram a se encontrar e só não retomaram o trabalho artístico em conjunto porque já estavam em caminhos distintos.

 

Jotabê Medeiros afirma, em entrevista dada à folha de s. Paulo (reproduzida hoje no Diário do Pará) que Raul e Paulo produziram “algumas das canções mais poderosas, do ponto de vista da ressonância cultural, do nosso tempo”. E que, separados, perderam expressão, deixando de ser o que, juntos, significavam: “uma força da natureza”.

 

Por esta avaliação tem-se uma medida exata do que significa a “revelação” que o jornalista fez no livro: uma açodada maneira de promover o livro.




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