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Jornalista diz que curso sobre 'golpe', oferecido pela Ufopa, é um processo intelectual desonesto

Lúcio Flávio Pinto - 06/05/2018

Sob o título original " O golpe chega a Santarém", o jornalista Lucio Flávio Pinto escreveu:

 

"O curso (dito livre) “Golpe de 2016 e o futuro da democracia” chegou à Universidade Federal do Oeste do Pará, a Ufopa, em Santarém. A primeira aula será no dia 8. A partir daí, às terças e quintas-feiras, se prolongará até o dia 28 de junho.
A iniciativa é do Grupo de Pesquisa HISTEBR e do Programa de Pós-Graduação em Educação, coordenada pelos professores Anselmo Colares e Wilverson Melo, do Instituto de Ciências da Educação, e com participação de Doriedson Almeida, do Centro de Formação Interdisciplinar, e Sylvia Castro, do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Pará.
Segundo o portal da Ufopa, o curso “irá analisar o processo de deposição da presidência de Dilma Rousseff a partir dos planos histórico, político e educacional. Serão trabalhados os conceitos de “golpe de Estado” e a perspectiva de “cultura do golpe” no Brasil e na América Latina, além de análise dos desdobramentos na educação brasileira e perspectivas futuras para a Ufopa”.
Ou, conforme o resumo do curso, ele “tem por objetivos complementares: (1) Entender o que é o Golpe de Estado e a cultura dos golpes na História do Brasil; (2) Compreender os golpes e Ditaduras no Brasil e América Latina; (3) Entender os elementos de fragilidade do sistema político brasileiro que permitiram a ruptura democrática de maio e agosto de 2016, com a deposição da presidente Dilma Rousseff. (4) Analisar o processo de Desconstrução da Democracia e investigar o que a agenda atual de retrocesso nos direitos e restrição às liberdades diz sobre a relação entre as desigualdades sociais e o sistema político no Brasil; (5) Perscrutar os desdobramentos da crise em curso e as possibilidades de reforço da resistência popular e de restabelecimento do Estado de direito e da democracia política no Brasil; (6) Analisar os reflexos do Golpe na Educação Brasileira e quais as perspectivas futuras para a Ufopa”.
Ainda segundo o discurso oficial, o curso “se agrega aos demais cursos em diferentes formatos oferecidos por mais de 40 universidades brasileiras. Todavia, a proposta da UFOPA se diferencia por fazer a convergência de análise nos planos históricos, políticos e educacionais, voltados a realidade brasileira e amazônica”.
Ao promover uma análise interdisciplinar da história, ciência política e educação, os organizadores do curso querem “chamar atenção para a cultura do golpe tão presente no Brasil e América Latina, bem como analisar quais são e serão os retrocessos e reflexos deste golpe de 2016 na educação e sociedade brasileira. [Em] Que pese isto, esperamos que tais análises e estudos críticos acerca desta conjuntura sócio-educacional e política possa contribuir para o desvelar dos aparelhos ideológicos de Estado, presentes na sociedade brasileira, além de contribuir no processo cognitivo de maturação crítica e racional dos cursistas”.
DESONESTIDADE INTELECTUAL
Todos esses propósitos caberiam num projeto de pesquisa – coletivo ou individual, mas é inaceitável num curso sistemático, aberto aos que nele se inscreverem. Aberto, mas não livre. Não há hipóteses de trabalho. O objetivo é provar a sua premissa: a então presidente Dilma Rousseff foi afastada do cargo por um golpe de Estado.
Não haverá controvérsias ou sequer um dualismo no curso (que deveria incluir uma alteração concreta e objetiva do mandamento legal que imporia a perda dos direitos políticos de quem foi atingida pelo impeachment, o que não ocorreu), mas uma doutrinação que pode equivaler a uma lavagem cerebral, se a postura de quem ensina for a de – mais do que professor – mestre ex-cathedra, É um processo intelectual desonesto, que não resiste a qualquer questionamento um pouco mais rigoroso.
A Ufopa, ao endossar, como curso oferecido pela instituição, o que poderia ser, no máximo, um programa de pesquisa, uma dissertação de mestrado ou uma tese de doutorado, se avilta, assume seu partidarismo, renuncia ao cultivo do saber e passa a ser a extensão de um grupo de docentes indignos de representar o espírito acadêmico e universitário.
A Ufopa emparelha com a UFPA na condição de instrumento a serviço de propósitos rasteiros, de uma empreitada política e eleitoral. Tão nova e já tão cheia de vícios.
Como santareno, que ama a sua terra e lhe deseja o melhor, lamento muito que uma instituição tão aguardada se sujeite à audácia de uma vanguarda facciosa.
Minha tristeza é maior porque, meio século atrás, em 1967, participei da solenidade de lançamento da pedra fundamental da Faculdade de Filosofia. Era uma ideia que teve o apoio do meu pai, prefeito municipal, mas foi morta no nascedouro, quando ele foi afastado do cargo e cassado pelo regime militar no ano seguinte. Chovia quando fiz meu discurso, de adolescente cheio de ideais e de esperança, como ainda hoje, na velhice, apesar de tudo. Apesar das chuvas e trovoadas pelo caminho."




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