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Lula, o injustiçado?

Lúcio Flávio Pinto - 13/07/2017

Créditos: Lula: um injustiçado? Foto: El Pais

A condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi um ato político, não um processo jurídico. Para não variar, os petistas garantem sinda ser o mais grave processo político da história do Brasil.

Ofendem a memória de muitos – inclusive alguns futuros petistas – que morreram, foram condenados ou cumpriram penas por atos verdadeiramente políticos: combatiam o regime numa época em que ser da oposição podia ser crime grave, enquadrado como subversão e terrorismo pela draconiana Lei de Segurança Nacional, a espada afiada que pendia sobre a cabeça da inteligência nacional.

Tais agentes políticos não foram sentenciados por corrupção ou suspeita de corrupção. Mesmo os grandes líderes políticos até o fim da democracia de 1946, apenas 18 anos depois que ela começou, acusados de corrupção num momento em que deixaram de ter vigência as garantias e os direitos individuais, sujeitos a ritos de investigação sumaríssima, saíram ilesos dessa acusação, como os ex-presidentes Juscelino Kubitscheck e João Goulart, os mais visados e esmiuçados dentre os integrantes da cúpula do poder.

Lula foi condenado a nove anos e meio de prisão, em regime fechado, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro – não por executar algum programa de governo subversivo ou ilegal. É muito diferente. Mas seus defensores alegam que ele não tinha como escapar a um destino manifesto: o que o juiz federal Sérgio moro traçou desde o início da ação. O juiz teria sido parcial, impulsivo, tendencioso, agindo de má fé, praticando atos ilegais, abusando da sua autoridade, tornando sua jurisdição ilegítima.

No entanto, fracassaram as várias tentativas da defesa de Lula de provocar a suspeição do juiz ou vê-la reconhecida na instância recursal. Os recursos à segunda instância, onde a decisão é colegiada, com três votos, ou em plenários maiores, foram indeferidos. Todos.

As decisões interlocutórias do juiz, em mais de dois anos de instrução do processo, foram confirmadas pelos magistrados do segundo grau na sua esmagadora maioria.

Logo, ilegal e ilegítima a sua atuação não foi. Exceto no âmbito do tribunal de exceção, que o PT costuma montar quando desagradado, contrariado ou punido. Derrotado nos confrontos com o juiz e incapaz de fazê-lo resvalar para a objetiva retaliação, que o tornaria passível de impugnação, os petistas reagiram à decisão final praticando o que atribuem ao juiz da causa: desconhecendo o conteúdo dos autos.

Duvido que os veementes e às vezes agressivos parlamentares que ontem condenaram Moro ao quinto dos infernos tenham lido sua sentença, de 238 páginas. Acabo de lê-la pela segunda vez, com mais vagar e anotações à margem do texto na revisão.

A sentença pode ser combatida e o será, por ambas as partes. A defesa de Lula tentará provar o que já disse e repetiu ad nauseam, sem convencer o julgador individual: o ex-presidente é inocente. O Ministério Público Federal se empenhará, sobretudo, em agravar o prazo da pena de prisão, que o juiz dosou pelo mínimo previsto na lei processual penal.

Ninguém que tenha procurado ler com isenção o trabalho de Moro e equipe, entretanto, deixará de ter material suficiente para afastar as hipóteses de subjetividade no pronunciamento do magistrado. Ele e seus assessores produziram uma peça dentro dos melhores padrões da técnica jurídica.

Seu relatório enumera, debate e combate cada um dos argumentos apresentados pela defesa do réu. Não passou por cima de nenhum dos questionamentos, inclusive as preliminares, abrangendo todos os incidentes processuais. Enfrentou-os de forma objetiva e com ampla fundamentação.

A sentença não se tornou longa, excepcionalmente longa para o padrão de redação de juízes brasileiros, para encher linguiça ou tergiversar. Foi para resistir à análise de outros julgadores, convencendo-os. Para ser confirmada, portanto.

Pode não ser, mas isso exigirá contra-argumentos de grande solidez. Moro não foi apoiado pela segunda instância no caso da condenação do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Mas a revisão foi decidida porque não houve a comprovação suficiente do crime a ele atribuído pelo acusador, o MPF (como aconteceu na armazenagem dos presentes presidenciais de Lula, insuficiência reconhecida por Moro).

O caso ainda vai subir até a instância final. Mesmo que não prevaleça a decisão do juiz singular, neo entanto, o caso Vaccari não serve de parâmetro automático para o caso Lula.

Seus defensores podem voltar atrás no que disseram ontem e encarar a sentença como uma peça formidavelmente consistente. Terão que trabalhar muito para modificá-la ou revogá-la.

Se quiserem continuar na estratégia atual, se exporão a um grande risco: não convencerem a sociedade brasileira que se trata de mero expediente da elite brasileira para impedir Lula de novamente se eleger presidente no próximo ano. Pouca gente foi às ruas ontem. A resposta não deverá mudar pelos próximos dias.

Ou o povo se cansou ou, quando um líder é condenado por corrupção, deixando de ser apenas acusado, o clima muda. E para retomar o ambiente anterior é tão difícil quanto continuar a martelar no éter espacial que Lula é o maior pserguido político da história do Brasil.




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