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Descaracterização do patrimônio histórico é marca constante em reformas da Catedral de Santarém

Weldon Luciano - 13/09/2018

O patrimônio histórico de Santarém, oeste do Pará, sofre com a descaracterização constante e nem mesmo o prédio mais antigo da cidade escapou. A catedral passou por diversas reformas ao longo do tempo, que modificaram drasticamente o templo. Na atual reforma, que iniciou no mês de agosto e deve terminar em outubro, a colocação de cerâmica no revestimento das paredes causou polêmica entre alguns fieis. A Diocese nega que tenha causado danos ao patrimônio histórico e garante que todas as mudanças estão sendo feitas para garantir melhor estrutura para aqueles que frequentam o local.

Sua construção iniciou-se em 1761, na Praça Monsenhor José Gregório, cem anos após a construção da primeira capela da cidade erguida pelo Padre João Felipe Bettendorff, fundador da cidade. A inauguração da igreja deu-se em 08 de dezembro de 1819. A construção original era dotada de duas torres, similares às atuais, porém levemente menores. De acordo com o padre e historiador Sidney Canto apenas as paredes do templo podem ser consideradas originais.     

A primeira reforma ocorreu em 1838 e 1839, modificando aspectos internos e externos do prédio que foi avariado durante o período da Cabanagem. Após o desabamento de uma das torres, ocorrido em 1851, o espaço voltou a passar por obras. Em 1876, uma nova intervenção foi feita a mando do Monsenhor José gregório Coelho. Na época foi erguido o altar-mor feito em mármore que perduraria até o século XX. As obras só foram concluídas em meados de 1881. Em 1883, o prédio foi elevado à categoria de catedral.

 

Pinturas laterais estão sendo encobertas por revestimento cerâmico.

 

“Se você analisar do ponto de vista histórico, a catedral já passou por diversas reformas. Já desde 1838 e 1839 que o templo vem sendo descaracterizado de sua originalidade, assim como em 1851 e 1876 quando foram feitas modificações gerais interna e externamente. De 1881 para cá até o altar original foi demolido para dar lugar ao de mármore, que todos pensam que era o original. Nem mesmo ele pode ser considerado original por ser uma construção feita a mais de 130 anos após o prédio ser erguido. Nem mesmo o crucifixo de Von Martius é original, pois ele só foi colocado em 1846”.  

De acordo com os relatos e registros, as paredes internas permaneceram brancas até o ano de 1895, quando o Padre Theodoro Thaubi ordenou a pintura arabesca, formadas por padrões geométricos de repetições entrelaçadas inspirados na cultura árabe e greco-romana, principalmente do período bizantino.

“Originalmente, segundo os arquivos que se tem acesso, a pintura das paredes era caiada de branco e piso de cedro, inclusive muitos enterros aconteciam na própria Matriz. A partir de 1895 se iniciam as pinturas arabescas para tirar a tonalidade branca, que também não é a pintura arabesca que a gente vê hoje”.

Em 1928, a missão de repintar os arabescos ficou a cargo do pintor conhecido por Manoel “Ligeiro”, a mando de Dom Amando, quando a igreja passou a ter o aspecto de tijolos e friso de flores, “marmorizando” a parede.  Em 1965, uma nova reforma retirou toda a pintura e o altar-mor deixando o templo nas cores branco gelo e cinza. A intervenção de 1986 que encerrou somente no ano seguinte teve a marca do artista plástico Laurimar Leal que se baseou em fotos antigas para recompor em partes os arabescos feitos em 1928.

Nos últimos 32 anos, as paredes receberam pintura por outras quatro vezes, sendo a última em 2007, quando foram feitos os arabescos das paredes que remetem ao mármore da atualidade, que serão substituídos por um revestimento em cerâmica.  “Nem mesmo a pintura do Laurimar Leal feita em 1986 existe mais. A pintura interna já foi refeita quatro vezes por diversos pintores que mudaram os traços do artista Laurimar Leal. O que temos hoje é um local totalmente descaracterizado de sua originalidade. Se formos voltar as descrições do passado tínhamos uma igreja com traços mais simples e não tão sofisticados quanto a maioria das pessoas pensa. A cada 20 anos o local sofre mudanças significativas principalmente na pintura. A utilização da cerâmica é um tipo de manutenção que talvez evite a necessidade de se pintar de tempos em tempos como acontece hoje, reduzido gastos com reformas futuras”.

Orçada em R$ 500 mil, a revitalização faz parte do planejamento da Diocese para o centenário do Círio da Conceição, que acontece no mês de novembro de 2018. O recurso foi arrecadado por meio de doações de famílias e empresas. Aproximadamente 30% já foi concluído e além da chamada nave, local aonde acontecem as celebrações, outras cinco salas também estão sendo recuperadas para serem utilizadas em atividades da catequese. O forro foi todo trocado e as centrais de climatização também. Para dar fim as infiltrações, em diversos pontos, o reboco das paredes foi refeito e as calhas foram substituídas. As pias que servem água benta aos fieis que foram inseridas nas laterais do altar na reforma de 1986-1987 devem retornar à porta de entrada aonde ficava em tempos mais remotos.  




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