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Ferrovia é paraense, o domínio é chinês

Lúcio Flávio Pinto - 04/01/2018

Créditos: Representantes da China Communications Construction Company (CCCC) se reuniram com o governador Simão Jatene, no Palácio do Governo, em Belém, para debates sobre o projeto da Ferrovia Paraense. Foto: Agência Pará

Uma semana depois que o governador Simão Jatene assinou um memorando de entendimento com empresários chineses, na embaixada da China, em Brasília, no dia 6, o documento foi publicado na edição do dia 14 de dezembro de 2017 do Diário Oficial do Estado.

O memorando diz respeito a uma obra que é o maior projeto concebido pela atual administração do tucano, ao longo dos seus 11 anos de duração. É a Ferrovia Paraense, projetada para ter 1,3 mil quilômetros de extensão e custar 14 bilhões de reais. Desviaria para Barcarena um fluxo de carga que poderia chegar a 100 milhões de toneladas, de tamanho equivalente ao da ferrovia de Carajás, construída pela Vale, evitando que ela siga para o Maranhão ou para o sul do país.

 Para uma obra desse porte, era de se esperar que o governo divulgasse a íntegra do memorial de entendimento, para pleno conhecimento e debate da sociedade paraense. Mas o que saiu foi um raquítico extrato dos documentos relativos à China Railway Nº 10 Engeneering Group e à CCCC South America Regional S. A. R. L.

O objeto do entendimento é “o esforço comum entre os signatários para a implementação de projetos de desenvolvimento de infraestrutura logística, comercial e industrial, com agregação de valores à Economia do Pará e, consequentemente, do Brasil, mormente com a construção e operação da Ferrovia Paraense”.

Ou seja: o governo privatizou não apenas a obra. Foi além: privatizou a função pública de planejamento e gestão da ferrovia e do que mais os chineses entenderem de incluir no seu escopo.

Por quanto tempo? O extrato diz que o memorando entrou em vigência na data da sua assinatura, “permanecendo em vigor até o seu fiel cumprimento, salvo a ocorrência do disposto na Cláusula Oitava ou Nona”.

Quais são essas ressalvas? O cidadão paraense não saberá. Por isso mesmo, o memorando não foi publicado. Talvez porque seus subscritores têm a plena consciência de que é usurpação de função pública por ente privado e um cheque em branco para os chineses.

Se essa obra sair, ela será chinesa. O governo paraense, que vinha conduzindo a ideia, delegou-a completamente a um grupo empresarial do setor ferroviário e um fundo financeiro, ambos da China. Eles estão autorizados a fazer o que quiserem, inclusive sentar sobre a ferrovia.

Se ainda existe Ministério Público e Assembleia Legislativa no Pará, esses dois órgãos, para manter o equilíbrio institucional no Pará, precisam obrigar o chefe do poder executivo a oficializar a íntegra desse perigoso memorial de entendimento. Ele pode ter cometido um ato de lesa-Estado, que não pode prosperar, sem que a sociedade se manifeste – diretamente ou por suas entidades representativas.

Parece que o governador Simão Jatene deixou para o seu final de mandato a maior e mais grave iniciativa. Algo como um presente de grego para os troianos sitiados em sua cidadela pela insegurança pública, um dos maiores legados da administração do PSDB no Pará.




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